terça-feira, 28 de dezembro de 2010
- O Encontro Consigo Mesmo - Cap. II - Aquilo que nos aprisiona -
Sigo em frente, mas o caminho leva-me a descer cada vez mais. Há lama, barro, água suja. À frente vejo uma pequena luz e ouço um pequeno soluço, era uma menina segurando uma vela nas mãos nuas, a chama é fraca, mas a parafina fere suas pequenas mãozinhas.
(AM) – Quem é você menina? O que faz aqui nesse lugar terrível?
(M) – Estou aqui para lhe pedir que não mais caminhe para frente, pois cada passo seu faz a parafina escorrer e queimar minha mão.
(AM) – Então solte a vela, às vezes é necessário nos perdermos na escuridão, pois quando há claridade, já sabemos de tudo que está ao nosso redor e não nos permitimos viver a aventura do risco que está presente em cada instante.
Dito isto, pude dar mais um passo, mas a parafina escorreu e queimou a mão da menina e ela chorou muito. Ver aquela criança, naquele estado e saber que eu a causara mal fazia - me retroceder. Pude sentir minhas asas ficando mais pesadas. Quando retrocedi, a menina, com a outra mão, que não segurava nada, ergueu-se, havia unhas compridas nela, assemelhavam-se com a garra de um predador e, ao move-las com rapidez para baixo, cortou o ar e rasgou meu corpo, olhei para ela, mas não senti raiva, mas pena, coitada da criança. Porém, mais uma vez, ela cortou o ar e rasgou mais uma parte do meu corpo.
(AM) – Por que você faz isso? Por que me machuca?
Ela apenas ria a cada vez que me fazia sangrar, dizia que o fluxo do meu sangue era devir para seus olhos. "Isso é injusto, o que fiz eu para ter isso dessa menina?" Reuni minhas forças e pus a caminhar na direção dela, a cada passo via a parafina escorrer mais e mais e queimar sua mão, ela chorava, seu choro era profundamente entristecedor, penetrava em minha mente e feria meu espírito. "Por que estou fazendo isso? Serei eu tão cruel a esse ponto?" Pus minhas mãos em meus ouvidos e caí de joelhos no chão, não suportava aquele choro, pesava, sentia culpa. "Mas, por que alguém pode sofrer se tudo o que faço é “caminhar para frente”? Que mal há nisso?"
A menina viu que meus pensamentos eram fortes, mas quanto mais se intensificavam, mais ela sofria, podia ver a pele dela rasgar a cada pensamento meu. Freei então meus pensamentos. “O mal, por que fazemos o mal ao outro simplesmente por querer caminhar?” Ainda de joelhos, meus olhos encheram-se de lágrimas, era como se todo o meu coração expelisse os frutos da culpa. Diante dessa situação senti-me fraco, minhas asas de metal ficaram pesadas como nunca, e havia pensado na possibilidade de não mais deixar a vida prosseguir, pois ela marca um rastro de sangue que não é seu por onde passa. Ao pensar isso, a boca da menina se abriu, e de sua boca saiu uma enorme língua que enrolou em meu pescoço, senti que ia perder a cabeça e com ela todos os meus pensamentos. “Pra que serve o corpo sem pensamentos? Meramente sensação? Se vive? Não sei.... mas quanto mais penso mais leve ficam minhas asas. Eu só quero passar, não posso deixar de ir adiante apenas pelo motivo de alguém não ser forte o suficiente para largar a fraca luz que segura e que lhe faz mal, e atirar-se na escuridão para ver o que encontra. Se parar, perco os pensamentos e o sangue que corre em mim, se ir, talvez ela decida ir também, e então a libertarei.”
Ergui então meu corpo e com um golpe cortei-lhe a língua, pus a caminhar para frente, e a cada passo a criança chorava e suas mãos se queimavam mais e mais, ao alcançar a posição lateral de seu corpo, olhei para ela e disse:
(AM) – Ou caia na escuridão ou afogue- se em lágrimas e, diante dessa luz, conte quantos gotas caem durante todo o resto de sua vida.
A menina não foi, e seu corpo permaneceu ali parado, tive a impressão de que ela teria se tornado brasa, mas só impressão, não olhei para traz para averiguar. Há coisas que não damos conta, como por exemplo a vontade do outro, isso é escolha de cada um, mas que as escolhas dos outros não se configurem tetos aos quais limitem o nosso crescimento.
domingo, 26 de dezembro de 2010
- O Voo Eterno -
Nem toda ave é pássaro
Mas para o homem, essa barreira pode ser transcendida.
O homem é infinito naquilo que pode e,
Ao contrário, deus está esgotado, já é tudo que poderia ser, encontrou seu limite,
O máximo em bem, beleza e justiça.
Deus não pode ser melhor do que é... é sempre esgotado.... não há possibilidade...
O homem pode, a cada dia, ser outro, por isso não se enquadra e nem quer ser divino...
É infinito para aquilo que lhe é possível.
domingo, 19 de dezembro de 2010
- O Encontro Consigo Mesmo - Cap. I - A Queda -
Posso sentir meu corpo cair, despencar velozmente e ultrapassar o limite do chão afundando-se no íntimo da escuridão do abismo. Dezenas, centenas de metros, corpo lançado ao fundo, cuspido do céu para cair nos domínios infernais. Mas não quero cair de vez, nem sei por que estou caindo, cair de vez pode significar minha morte, mas morrer talvez não seja uma má idéia, quem eu procurava não está mais aonde deveria estar e muitas pessoas morreram por mim. Talvez o meu espírito possua um valor maior que meu corpo e seja o suficiente para pagar o extermínio de tantas pessoas.
O peso de minha consciência torna meu corpo pesado, cair agora está no disparo, disparo para o fim ao encontrar com o fundo, morrer é a solução, é a justiça, a cada um.... a justa medida, e meu corpo não vale tantos milhares, minha alma não vale tantos milhares....
Meu corpo, ao encontrar – se com o solo no instante do impacto, se esfarela, a realidade do chão ao qual punha meus pés e agora deito o corpo para morrer, é dura. Espero um momento, mas a morte não vem. Ou será que é a vida quem vai? Morte é ausência de vida, então a vida deve se ausentar para que haja morte, que, na verdade, é apenas um espaço não mais ocupado. Se quero morrer, deixo então a vida ir, levanto-me do meu corpo e caminho, a morte está ali, lugar não mais ocupado, e eu, vida, vou. Vou não sei pra onde, caminho errante, caminhar no erro é aprender, mas que aprendizado há em provocar a morte de centenas de pessoas, mas tive que sair para encontrar uma pessoa. Mas se a pessoa não mais estiver, todas as mortes foram em vão.
Seria eu então feliz se não tivesse seguido o coração? E agora, no fracasso, sou eu feliz? Mas, se tudo tivesse dado certo, não estaria eu agora gozando de felicidades maiores? Às vezes, para termos mais e nos expandirmos, necessitamos arriscar perder aquilo que já temos em menor proporção. E eles, mesmo sofrendo derrotas, não seriam melhores se cada um se fortalecesse por si, do que confiarem toda sua segurança nas mãos de um só homem que julgassem ser o mais forte, mas que na verdade mal consegue voar com suas próprias asas? Não estaria eu então, assim como essas pessoas, desistindo da vida pelo fato de não ter mais confiança no futuro?
Voar por mim mesmo..... para alcançar um futuro..... mas o futuro é repleto de incertezas e há muitos “talvez”, mas a vida segue sua correnteza, leva para frente quem se deixa levar, arrasta, nos faz chocar com pedras pontiagudas, e as perfurações com que somos marcados por essas pedras nos fazem sermos mais fortes.
Após pensar essas coisas, consegui dar “um passo”, consegui “olhar” diante da escuridão do fundo do abismo ao qual caí e ver que há uma gruta ou algo parecido, já que o corpo ficou ali, pesado e gelado, resta-me caminhar puramente com o espírito.
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
- O encontro com Zaratustra -
Após ter passado pelos sete encontros das quatro direções deparo-me com uma montanha, será que necessitarei subir ao mais alto ponto já contemplado por mim neste mundo para saber o mistério do guerreiro mítico? Aquele que deseja o saber dos mistérios deve arriscar a vida, pois quanto maior o conhecimento, maior o perigo, e um pensamento errado pode nos desviar de tal conhecimento.
Mas, por que escalar se possuo asas para ao topo poder voar? Afastei-me algumas centenas de centímetros, pus-me a correr com toda a minha força e saltei o quanto minhas pernas permitiram e com o bater de asas tentei voar, mas algo estranho aconteceu, elas voltaram a ficar pesadas, pois num momento havia mudado meu pensamento e um simples desvio de pensamento pode afugentar o mais sagrado dos conhecimentos.
Percebendo o início de minha queda atirei-me em direção da montanha e me agarrei a ela, mas ela estava cheia de cacos de vidro que penetraram em meu corpo, sentia minha pele ser rasgada e perfurada. Apesar de tudo me mantive firme, tenho que efetuar tal subida mesmo que me custe algo de muito valor: minha saúde física. Escalei com todo o meu empenho e os cacos de vidro que estavam na montanha foram ficando para traz. Senti-me então otimista, o pior havia passado? Não!!! O pior ainda estava por vir!!! O vir – a –ser da alta periculosidade. Surgiram então, mãos e línguas da montanha, as mãos agarravam-se aos meus braços e pernas e os puxavam para baixo, as línguas adoeciam minha mente com palavras profanas e blasfemadoras de vida, expeliam toda a imundície, todo o escárnio do linguajar humano.
(línguas) – A nossa saliva atiraremos no pó do seu corpo que putrefará, faremos assim lama, e lá porcos dançarão e profanarão aquilo que seu corpo será, agora inundado de saliva das línguas dessa montanha, plantas de espinhos cresceram no barro e se alimentarão de moscas e todo tipo de vermes.
Essas palavras e diversas outras causavam terror na minha alma que ansiava partir, mas precisava soltar – me das mãos que me prendiam, não tinha alternativa a não ser golpear a montanha, mas, talvez não aconteça nada, talvez eu morra, talvez haja um monstro e me devore. Mas devo tentar.
Golpeei então a montanha com o meu punho, meu braço foi tragado para dentro por completo e pude perceber um sangue escorrendo de dentro da montanha. Como será possível uma montanha sangrar? Devo ter ferido-lhe o coração, e as mãos num instante ficaram paralisadas e as línguas secaram e caíram. Pude então continuar minha subida.
Após ter superado todo o percurso, alcancei o topo da montanha, com muito sacrifício consegui por o meu corpo por completo e deita-lo lá, mas o sofrimento continuaria, pois ali havia um homem sentado que olhou para mim e falou.
(HD) – você é muito ousado, ter desafiado a minha montanha e ter subido até aqui para obter um conhecimento que talvez lhe fará sofrer mais ainda..... muita idiotice da sua parte..... o conhecimento é só para aqueles que estão dispostos a suportarem o sofrimento.
(AM) – Quem é você, homem falante de voz pesada?
(HD) – tenho muitos nomes, uns me chamam de “Nietzsche”, outros de “Zaratustra”, mas isso não importa. Está aqui por que quer encontrar alguém não é?
(AM) – Como sabe?
(Z) – Vejo muito mais longe que qualquer homem desse mundo, e se ergui essa montanha, foi por ter decido fundo na dor da humanidade da minha época para mostrar-lhes que era possível viver sem condenar a própria vida.
(AM) – Mas, como que você irá me ajudar, como que irei ter o conhecimento necessário para poder voar com perfeição e encontrar quem preciso encontrar.
(Z) – Para voar pelos outros é necessário voar por si, sem si mesmo, nada pode pelo outro. E, digamos, como eu lhe disse, sou o homem que mais longe vê, e eu, tendo essa capacidade, posso saber de coisas que você nem sonha em saber, ora, ergui uma montanha, a mais alta desse mundo. Portanto, digo, quem você procura não mais lhe aguarda, pois foi encontrada por outra pessoa.
Dito estas palavras Zaratustra olhou friamente nos olhos do Homem de Asas de Metal e viu que escorria lágrimas de um silêncio ensurdecedor. Zaratustra continuava a observar o homem que se mantinha com a cabeça baixa e demonstrava-se pensativo.
(Z) – O que foi? Perguntou Zaratustra. Vai desistir de aprender a aperfeiçoar seu vôo?
Mantive-me em silêncio, pensando nas palavras que ele me disse, pode ser que esteja errado, mas, é o homem que mais longe vê, é o homem que edificou a mais alta e mais terrível montanha, e sempre que considerava verdadeira a sua afirmação meu coração rasgava os músculos do meu peito e sangrava pelos olhos.
(Z) – Tem mais uma coisa, lembra aquela cidade que você deixou para ir em busca daquilo que você já sabe que está perdido? Foi totalmente destruída, sem você com suas asas criadoras de furacões e tempestades para protege – la, todos morreram, inclusive as crianças, mas as mulheres fora levadas como escravas.
(AM) – Não!!!! Você é um mentiroso!!!
(Z) – Como que a verdade pode não estar comigo se consigo ver coisas da sua vida que estão a milhas de distância escondidos em seus pensamentos.
Calei-me...... não sabia o que dizer, percorri todo esse caminho, escalei essa montanha.... para quê? Para nada? Para constatar que tudo foi em vão?
(Z) – Quer saber como posso ver tão longe quanto nenhum outro ente é capaz?
(AM) – Isso é impossível..... como você pode? Você sem dúvida não é um homem comum, não é simplesmente um sábio...... o que você é de fato???
(Z) – Eu sou o “Super – Homem”, pois tive coragem de mergulhar no mais profundo abismo da dor e compreende-la, e ao compreender a dor, em meio a minha solidão, vislumbrei um enigma, e pude dar a mais gozada gargalhada. Superei a mim mesmo, trepei em minha própria cabeça para poder ver mais longe e subir mais alto. Quer voar com perfeição? Supere a si mesmo. Mas acho que não tem coragem para tanto. Você quer voar para os outros, isso é impossível, voe para si mesmo, e assim torna-se-á grande o bastante para abarcar aos outros.
(AM) – Dor, enigma, visão, por que a dor? Por que o sofrimento? Por que as asas são tão pesadas? Como lançar-me no mais profundo abismo da dor?
(Z) – Para isso você precisa de algo que se possui em raridade: solidão!!!
(AM) – Mas, a muito tenho caminhado sozinho.
(Z) – Solidão não é ausentar-se das pessoas, mas sim, na sua hora mais silenciosa, encontrar – se consigo mesmo. Por isso odeio a compaixão, rouba o direito de viver na dor do outro e o retira a possibilidade de ter solidão, fazendo – o perder-se de si mesmo.
(AM) – Não compreendo suas palavras.
(Z) - Torne-se solitário e entenderá.
Zaratustra então tocou – me com seu dedo na testa e, com um toque, empurrou – me do alto da sua montanha e comecei a cair, quando pensei que ia me espatifar no duro solo, penetrei-me nele e comecei a cair em meio à escuridão do abismo.
- Estrela lançada, cadente em aporia -
Por trás da coluna há um eu desconhecido!
Sou labirinto, caminho e me perco em meus passos.
Procuro extasiado e indomado o inexistente.
Tentei escrever algumas palavras, mas elas me vieram num sonho e desapareceram sem deixar marcas em nenhuma parede.
Tudo ficou disperso, o mar se tornou um quebra – cabeças cujas peças sua própria maré levou. Pego uma estrela e a atiro no horizonte do céu, ela vai e, em sua ponta, inúmeros números se multiplicam em cálculos e teoremas, mas no fim, culminam em aporia.
Todas as metáforas foram esgotadas de sentido tornando-se palavras vazias, falo sem nada a dizer, faço sem querer fazer, espero sem querer esperar, penso se meus pensamentos são realmente minha propriedade.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
- Encruzilhada -
O guerreiro mítico corre e desaparece em meio aos nevoeiros, eu, ao lançar – me, me perco de mim e me vejo lançado no centro entre quatro caminhos. Ventos quentes, frios, mornos e floridos, em todos a todo e ao mesmo tempo mergulho meu corpo indiferente de minha escolha.
Cada vento provém de um caminho distinto e fechado. Cair no centro de caminhos fechados, não há arbítrio entre os quatro, todas as possibilidades de caminho estão trancadas. Mas sinto alguma coisa permanecer, algo grita em mim e para mim, transcende os ouvidos por si mesmo, sussurra seu nome por si mesmo à minha escuta. Em tudo posso pensar, especular, momento inútil, pois diante de caminhos fechados não se pode escolher em qual pôr os pés.
A vida clama forte! Mas pode haver forte clamor em pleno momento de inutilidade? Sem arbítrio?
Por que escolher entre caminhos úteis? O que é um caminho útil? Ora, o que leva a algum lugar! Mas, diante de vários caminhos, qual o mais útil, qual o que leva mais longe? Estão postos e fechados, quem os construiu os trancou, por quê?
Para saber qual o caminho mais útil deve-se percorrer a todos, então, o caminho em si nada tem de valor, pois apenas é útil como meio. Mas, diante de caminhos trancados o arbítrio permanece morto, porém, a voz continua clamando em mim e para mim. Quando se cria um caminho pergunta-se para onde ele levará, se a chegada for algo proveitoso, há então utilidade. Mas, almejando chegar, pensamos aonde queremos chegar, e cada instante que chegamos em cada passo permanece morto, pois o que vive na concepção de caminho é a sua chegada.
Tenho que criar um outro caminho, mas todas as direções do mundo foram percorridas e agora estão fechadas e entre esses caminhos há apenas árvores, pedras, algumas montanhas e rios.
Em meio a esses pensamentos escuto o bater de um tambor e uma canção:
“o boa noite pra quem é de boa noite....
o bom dia pra quem é de bom dia...
a benção meu pai a benção....
Maculelê é o rei da valentia!!!!!”
Do meio da mata vejo surgir um homem trajando vestes de um guerreiro tribal, o som dos atabaques são o som dos seus passos, o olhar dos seus olhos é a faísca incandescente que cai do sol e salta do fogo, não é o guerreiro que eu procuro, mas emana muita sabedoria de suas palavras.
(M) – Está perdido guerreiro? Ou sabe onde está, mas necessita que te apontem um caminho para seguir? Tranquei todos, e agora?
(AM) – todos os caminhos que me levam a algum lugar estão fechados, não tenho por onde trilhar!
(M) – O caminho que leva a algum lugar é um caminho morto, pois se definiu, chegou aonde deveria, e trilhar o caminho que leva a algum lugar é chegar aonde alguém já chegou e descobriu um tesouro. Mas, o que acontece quando se encontra um tesouro? Leva-se embora. O caminho e sua finalidade permanecem ambos mortos e trilhar por eles é matar aquilo que te clama.
(AM) – Você está dizendo que a utilidade de um caminho é matar o caminho?
(M) – Quando se chega a algum lugar e denomina o caminho segundo o lugar que leva, matamos o caminho, pois tornou-se útil para levar a um lugar já alcançado, está definido, delineado, mapeado, todo o caminho assim vira estrada. A alternativa está no caminho inútil, quanto mais inútil o caminho mais vivo se torna, pois a cada passo se torna mais claro que se está na escuridão, não se sabe onde vai chegar e nem se vai chegar, por isso não leva a lugar nenhum, é inútil percorrer. Na inutilidade do caminho a finalidade não é direcionada para o fim, portanto o caminho nunca é meio, mas sim fim em si mesmo, cada passo, cada des-bravação é um chegada e uma descoberta. Caminho por caminhar, caminho porque a cada passo fortaleço as pernas. Quando se lança no caminho pelo caminhar apenas cada momento é contemplado, pois pode ser o último, pode ser que no instante adiante não consigamos nos manter de pé, e ao cair, perceber que os instantes em que alternamos os pés, perdemos e sacrificamos a vida, mas a cada sacrifício há um impulso cada vez maior, pois, por trás de cada arbusto há uma nova aventura.
(AM) – Por isso então que esses caminhos foram trancados, para que ninguém mais os percorressem?
(M) – Quem chega aqui nesse ponto em que os quatro elementos se tocam, cada um trazido por um vento e cada vento de um canto do mundo, não tem alternativa, o arbítrio é forçado a morrer.
(AM) – Mas, sem o arbítrio, o que sobra? Escravidão?
(M) – Vontade!!!! Essa é a voz que te clama, está para alem daquilo que foi posto para escolhermos. A vontade anseia em descobrir, por isso tem necessidade de escuridão, caminhos já iluminados pouco acrescentam a nossa arte, mas fazer arte é criar a todo instante, a arte por fazer arte, o caminho por fazer o caminho, criação e descoberta a cada passo.
(AM) – Compreendo suas palavras, preciso de solidão, preciso escutar minha vontade e pressentir para onde devo caminhar. Mas quem trilhou esses caminhos?
(M) – Cada um desses caminhos trilhou um guerreiro originário, cada um guardado por um elemento e estação. TERRA, AGUA, AR E FOGO, há muito descobertos como a fonte do todo o real. Cada um penetrou nesse universo de breu e escuridão, mergulhando na morte de todo o instante e desviando trevas adentro, e, o que conheceram, guardam como o mais precioso tesouro, por isso são chamados de “Guardiões”, os quatro guerreiros originários. Mas, você entendeu o porquê que encontraram algo? Não? E também o por que esses caminhos estão trancados? Se não, retire de si mesmo sua vida, pois não lhe é permitido dar um passo adentro dessas possibilidades.
(AM) – Compreendi o que dissestes.
Após dizer esta frase ao guerreiro tribal trancador de caminhos o vi desaparecer no meio do nada e do todo ali presente da mesma forma que surgira. Notei que no local em que estava e desapareceu permanecia uma argola e dela pendiam quatro chaves douradas cada uma com um símbolo correspondente a um dos elementos. Cada chave trazia cravado em seu corpo uma frase semelhante e comum a todas: “vontade ou arbítrio, o próximo passo é de responsabilidade dos seus pés”. Nesse momento meu espírito tentou-me, há maior facilidade, posso escolher qualquer chave e qualquer caminho, mas no fim, na chegada, o tesouro não mais estará lá, foi pego e está guardado por um guerreiro que se tornou Herói.
Este então é o marco separador, guerreiro para sempre ou Herói mesmo que por um momento. Atirei – me então no meio das trevas deixando jogada no chão as chaves douradas. O primeiro passo pode ser a última das mortes, mas, que assim seja.
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
- O Amanhecer visto de Olhos Fechados -
É noite, vi o amanhecer de olhos fechados, voz quieta e sorriso calado, lágrimas que corriam sem molhar, pensamentos derivados do soluçar. Soluços, pressão, agressão, meu amigo teme o mestre, torna-se pequeno por vontade própria, implora piedade por vontade própria, tem compaixão de si mesmo e exalta sua covardia. “Por que temer o mestre?” Pergunto a ele. “Se de sua mão arrancar-lhe a espada é para ensinar-te que é preciso segurar com mais firmeza.”
Disse a ele essas coisas enquanto observava o amanhecer de olhos fechados, o amanhecer amanhece primeiro por dentro, na noite, para depois coincidir com um outro amanhecer plural. O amanhecer de olhos fechados, inefável, catastrófico, é totalmente mistério para o outro. Observo um único sol provedor desse único amanhecer que somente a mim é possível contemplá-lo dessa maneira.
Olhos fechados!!!!!!
Vejo o amanhecer..........
Não posso lhe mostrar, não consigo falar e nem sei quando se inicia...
E nem sei quando alcança seu esplendor........
E sei muito menos se algum dia deixa de ser dia após o amanhecer.......
É amanhecer de fato, de um ato diverso do que foi dito.
Vejo e ponho-me a contemplar o amanhecer de olhos abertos, minhas vistas são feridas e rasgadas por essa luz matinal. Vista com olhos fechados........ é suave e fortalece a vista............. mas...... tudo bem............
O homem carregador de uma lança caminha caminhante totalmente andante em minha direção, observo e o vejo, avisto-o ainda distante e num instante de mim está diante. É-me familiar teu semblante. Sua lança, no ar dançante, é suspiro e canção de dor de um homem errante.
Levanto-me, ergo minhas asas pesadas do chão, frente a frente face a face, finalmente vejo de perto o guerreiro de uma só lança. Uma não por carregar apenas uma lança, mas sim por ser a quantidade necessária de golpe para derrotar qualquer inimigo. Um não em quantidade, mas qualidade, perfeição no manejo com a arma, perfeição no ato de vida e morte do combate, perfeição e compaixão, pois se mata o adversário com um único ataque.
(AM) – Quem é você, guerreiro carregador de lança? Quem é você que sempre se faz carne e da carne fumaça? Quem é você que livrou – me da morte algumas vezes?
(GM) – Protejo sempre os filhos do combate, mas somente aqueles aos quais o combate transforma em artistas. Seu corpo não é capaz de suportar meu nome, é preciso transcender o próprio corpo e purificar os ouvidos para ouvir quando eu pronunciar. Se quer saber quem eu sou deve trilhar o caminho que eu trilhei sem se perder de seu caminho, mas afirmo: seus pés sangrarão, sua mente se quebrará e nada restará em seu coração.
Dita essas palavras, o guerreiro partiu colocando-se a correr em direção à névoa que cobria parte do amanhecer e dispersou-se entre ela. Coloquei meu espírito e minha alma na sola dos meus pés e pus-me em direção á nevoa do amanhecer.
domingo, 5 de dezembro de 2010
- Pipa no céu -
Gosto, entre pela minha sensibilidade e faça morada nas minhas decisões
Desejo, igualmente me arromba e corrompe meus impulsos verdadeiros.
Minha mente é alimentada, vômitos e descargas de sujeira trazendo bactérias destroem meus pensamentos.
Penso que escolho...
Penso que sinto...
Penso que penso...
Acredito ser a minha vontade verdadeira vontade...
Somos igual pipa no céu: pensamos que somos pássaros.
- Da primeira vez que te beijei -
Depois daquele momento percebi que a boca servia para algo a mais que comer
Percebi, nesse momento, a sensação mais sagrada de toda a humanidade.
E, depois, não queria que tal sagrada sensação desaparecesse profanando-a com o ato comum de se alimentar.
Percebi, nesse momento, a sensação mais sagrada de toda a humanidade.
E, depois, não queria que tal sagrada sensação desaparecesse profanando-a com o ato comum de se alimentar.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
- Escapulário -
Na morte por amor há beleza
Mas naquela pela justiça há maior nobreza.
Ei menino de cabelos castanhos!
Você tem o futuro na palma das mãos?
Eu só vejo um cemitério...
E minha pátria dorme num caixão sorrindo pra mim
Não sei mais.... viver é sorte?.... coragem é estupidez?.... amar é odiar?....
Morrer.... é a solução?
Somos do Estado reféns, jugam todas as pessoas e não são jugados por ninguém.
Somos irracionais, cegos, não percebemos que antes os dias eram diferentes...
E hoje todos iguais...
Santo, meu santo... do meu escapulário é o revolver...
Santo, meu santo... frio e blindado....
Viver é sorte? Coragem é estupidez? Amar é odiar? Morrer não é a solução?
SOLUÇÃO!!!!!!!!!!!!!!!
terça-feira, 23 de novembro de 2010
- Objeto e produto, a Maquinaria -
Vocês me deram um desejo
Me deram um sonho e um arbítrio.
Me deram o gosto e do que gostar
Me deram a verdade com a qual minto para mim mesmo e, em troca disso tudo, levaram minha vida...
Vida? Qual o significado do signo dessa palavra?
Não sei!
Tudo o que sei
Tudo o que é certo
É que sobrevivo...
Mergulhando em lágrimas, velando memórias, vontade a muito roubada. Doce ilusão, amarga desilusão, quando me acorrentam os braços e pernas e me lançam na masmorra, a vontade não satisfeita me assombra e a morte me apavora. Mas, quando vejo face a face a liberdade, não mais tenho a vontade... tenho angústia...
Sonhei com esse momento e só encontrei o vazio...
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
- Canção de silêncio -
A noite ainda entoava cantos de silêncio, a ausência de sons nos permite escutar a voz dos nossos pensamentos e os gritos de nossa alma. Assim permanecia o Cavaleiro Negro contemplando o céu que para ele voltara a ter estrelas desde o dia em que conhecera Jolie.
Sua alma era vácuo, silêncio, calmaria, mas, do vácuo surgiam mundos de sentimentos que afloravam, que emergiam, tudo era novo para ele, não sabia lidar com tais coisas, não reconhecia a si mesmo. Não conseguia ver além do breu de sua alma, escondia-se de seus próprios olhos. Mas, por quê? O mistério é sua essência, mas, com esse mundo novo que via brotar do seu íntimo, sentiu esperança em ver a si mesmo brotar de sua alma.
Mas, a noite ainda entoava cantos de silêncio, permanecia pura, sem o sol para profaná-la. Nessa ausência de tudo temos a nós mesmos. Lembrava-se de Jolie, tão frágil sendo carregada em seus braços, aquele rostinho desacordado. Lembrava-se do momento em que a pôs na cama e sentiu vontade de velar pelo sono dela, mas tinha que ir, sabia que não podia ficar, não queria ele ter fama de aproveitador. E também a senhorita Weltem o aguardava para saírem dos aposentos. “Mas, se pudesse, pensou ele no silêncio noturno, ficaria lá”, “mas.... se ela me pedisse.... ficaria ali.... somente ali..... velando pelo teu sono, pelo teu descanso, socorrendo-a de seus pesadelos”.
Estava ali, naquela noite, tinha somente a si mesmo, sentia frio, sua alma, até aquele momento era fria, mas passou a gerar calor e por isso sentia a frieza da noite. Pensou no que acontecera enquanto a noite ainda permanecia pura. Quando o sol nasceu, partiu para a floresta para alimentar seu espírito.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
- O Templo de Zeus -
O guerreiro, sem nome e errante, eternamente pecador, viu que a imagem do homem de asas de metal vista no espelho desaparecera e, em seu lugar, surgiu a imagem de umas ruínas muito antigas, pareciam templos consagrados há muito tempo abandonados. Esses templos eram sustentados por colunas de concreto que se estendiam para próximo do céu demarcado por sua vista.
“Curiosa imagem” – pensou ele – “curioso espelho” – pensou segundos depois. O espelho então começou a enlanguescer – se, esticou o quanto foi possível e necessário para cobrir todo o horizonte e, como num abraço, envolver completamente o viajante em sua realidade.
Sentiu-se confuso, nunca havia acontecido em sua vida tantos acontecimentos fantásticos em tão pouco tempo. Buscou em sua memória, tão vaga, tão pouca, o instante em que tudo isso havia começado. Remeteu-se então a um momento em que caminhava por um caminho tomado pelas correntezas de um rio e que seus pés afundavam e se prendiam na lama. Lembrou-se disso e seu coração encheu-se de tristeza. Deixou então sua memória conduzir seus pensamentos e viu que a imagem de uma serpente alada pairava em sua cabeça, disso jamais se esquecera, como poderia, impossível esquecer. Deu-se conta então que todos esses acontecimentos súbitos tiveram sua origem ali, diante daquela serpente alada que lhe dizia que a vida é um instante de raio na imensidão do céu.
Lembrou-se que não havia entendido nada e desde então havia decidido compreender tais palavras. Perseguia suas ideias que lhe escapavam como borboletas e, ao partir em busca delas, viu muitas coisas e conheceu muitas pessoas. Lembrou-se do homem com cabeça de leão que lhe disse para que não se envergonhasse de quem ele é, da mulher presa na rosa que abandonou sua permanente beleza para lançar-se mundo afora disposta a deixar que seu coração seja marcado por cicatrizes e costurado com linha e agulha quantas vezes fosse necessário, lembrou – se também de um filósofo que lhe presenteou com uma pedra filosofal e que a partir disso havia chegado até ali, diante do espelho, e visto um homem de asas de metal que repetia os mesmos movimentos que ele. Lembrou que já havia visto esse homem voando e decidiu que um dia também seria capaz de voar com asas de metal.
Parou, caiu de joelhos diante daquele templo e derramou lágrimas, surpreendeu-se, pois nunca havia antes chorado tão verdadeiramente quanto naquele momento, orgulhou-se de ser capaz de chorar, orgulhou-se de ter vivenciado o inimaginável fantástico da vida. Chorou verdadeiramente, pois se emocionava ao olhar para si mesmo, não era mais tão covarde quanto antes, mas também não era totalmente corajoso. A covardia sempre acompanha o homem, e até mesmo aos grandes heróis. A coragem é um anjo que pousa em nossos ombros, a covardia, um outro que se apoia em nossos calcanhares.
Nesse momento uma moça passava por ali, carregava ela em seus braços algumas ervas e, atravessando seu corpo, pendia um cantil com água. Comoveu-se ao ver um homem, já feito, chorando daquela maneira. Ficou preocupada e, com cautela, se aproximou.
- Está tudo bem com você? Perguntou a moça.
- Embora minha aparência não demonstre – disse ele – Nunca me senti tão feliz em toda minha vida.
- Feliz??? A moça nada compreendeu, achou tal homem muito esquisito, perdido ali, caído de joelhos e chorando. Talvez estivesse louvando ao deus do templo por alguma dádiva. Bom, decidiu não fazer muitas perguntas e confiar em sua hipótese. Pensou então em convidá-lo para entrar no templo.
- Venha – disse a moça delicadamente – você deve estar muito cansado, entre um pouco no templo comigo e descanse.
Ele concordou, decidiu entrar, mas não por curiosidade.... tá, estava um pouco curioso sim. Decidiu entrar.... mas não por querer descansar, um guerreiro nunca descansa..... tá, isso é bobagem, todo guerreiro necessita de descanso e ele não era uma exceção à regra. Mas, por que então decidiu entrar, se não eram estes nenhum dos motivos pelo qual decidira entrar? Estava ele aprendendo a ouvir o próprio coração e sabia que se dissesse para si mesmo que esses eram os motivos, estaria mentindo para si mesmo. Entrou, mas sabia o que o movia, a vida é um instante de raio, e viu-se encantado pela moça, talvez nunca a veria novamente, talvez, se não entrasse, nunca iria nem ao menos saber seu nome. Entrou convicto.
Caminhou olhando discretamente a moça, não sabia o que dizer, nunca seu coração havia se sentido daquele maneira, então, como se comportar?
- Qual o seu nome? Perguntou ele para a moça.
- Já tive uma “multidão” de nomes, pois a cada momento me sinto diferente, a cada momento escolho um nome que me caracteriza. E, agora, chamo-me Morgana.
- Morgana.... bonito nome..... significa o que? Alguma divindade? Disse ele com segundas intenções.
- Como sabe?
- Sei lá.... sabendo.... - ficou meio sem graça, mas continuou a falar mesmo assim – pois você é tão linda quanto e por isso pensei comigo: ela tão linda desse jeito, tipo..... sendo senhora dos seus nomes..... por que não escolheria se chamar como uma deusa bem bonita?.....
Ela percebeu que ele estava tentando ser “galante”, mas avisou logo.
- Aqui sirvo aos deuses.... – disse ela mas, no silêncio de seus pensamentos, escutou seu coração lhe dizer: poderia ser de outra maneira. Que tolice, reprimiu-se a si mesma, escolhi servir aos deuses, devo afastar tais pensamentos.
- E você, qual o seu nome? – perguntou ela querendo disfarçar para si mesma a voz que ouvira de seu coração.
- Boa pergunta... não sei qual o meu nome.... não me lembro de muito coisa sobre mim....
Ambos ficaram em silêncio por alguns instantes.
- Tive uma ideia!!! Disse ele.
- Qual?
- Você, com toda essa sua graciosidade, pode me dar um nome.
- Eu? Como assim?
- Vai lá, confio em você.
Morgana pensou, pensou um pouco mais, olhou para o rosto dele, analisou um pouco, pensou um pouco mais e concluiu.
- Héracles, vou te chamar assim. Pode ser?
- É.... – torceu um pouco o nariz – esperava um melhorzinho, mas, por ter sido você, será uma honra ser chamado por esse nome.
Caminharam mais um pouco e ele decidiu perguntar para ela a qual deus pertencia aquele templo.
- Esse templo pertence à Zeus, o maior de todos os deuses, quer que eu te conte um pouco sobre sua história.
- Gostaria sim, será um prazer lhe ouvir.
- No início existia somente o Caos e dele nasceu Gaia, a mãe de todas as coisas. Gaia vivia só e lamentava-se pelo fato de sentir sua fertilidade e não poder fazer surgir vida dela mesma, uniu todas as suas forças e gerou de si Urano para ser seu consorte e amante. Tiveram alguns filhos, mas Urano, temendo ser derrubado por seus filhos, os lançou para as profundezas da terra. Gaia ficou triste, sentiu raiva de Urano, como ele podia ter feito aquilo com seus filhos. Planejou então vingar-se. Necessitava de alguém dentre seus filhos que fosse forte o suficiente para derrubá-lo, para isso tomou a frente Cronos, que, com uma arma fornecida por sua mãe, castra seu pai Urano. Sem o falo, Urano perde seu poder e é separado de Gaia tornando-se o céu. Agora, a única forma de fecundar Gaia é através das chuvas que derrama sobre ela. Cronos, o tempo devorador, se fortaleceu e teve alguns filhos, mas temendo ter o mesmo fim que seu pai, os devorava. Porém um deles Gaia conseguiu salvar escondendo-o, e este era Zeus. Ele cresceu e se tornou forte o suficiente para matar seu pai, Cronos, e, ao fazê-lo, tornou-se o senhor de todas as divindades e portador dos raios e trovões do céu e seus filhos eram deuses.
Ele, ao ouvir, ficou fascinado por aquela história e, ao pensar sobre ela, compreendeu algo que tornava mais claro o que a serpente lhe dissera antes sobre a vida como instante de raio: Zeus, o senhor dos raios, matou Cronos, o tempo devorador. Aí está a metáfora, pensou ele, interprete quem puder.
Morgana percebeu nos olhos do viajante certo fascínio, algo da história que contara havia ressoado em seu interior. Os olhos dele brilharam e pode ouvir uma canção repleta de paixão e desejo, por ela e também pela vida. Sentiu vontade de, naquele momento, entregar-se a ele. Mas, não, como ousava pensar tais coisas, como ousava sentir tais coisas, havia ela jurado ser somente amante dos deuses. Mas pensou e escutou a alma dele falar por meio da canção, ele era um viajante, buscava um conhecimento que não se ensina, mas é escrito e marcado no corpo por uma força poderosa e conhecida, mas, quando se pergunta sobre “o que é essa força”, não mais a conhecemos. Força selvagem e indomável.
Sabia que a alma dele era capaz de sacudir o mundo em busca do que almejara, pois a vida é um instante de raio, e nada mais..... e nada menos..... Sabia ela que nunca mais o tornaria a vê-lo, trilhava uma jornada cujos caminhos ele mesmo deveria criar.
“Sua vida pode ser diferente....” escutou ela seu coração.
Héracles olhou para ela, mas os olhos de Morgana se desviaram do dele, então se lamentou e partiu. Triste por um lado, mas feliz por outro, pois, naquele momento esteve apaixonado e por isso tal momento valeu a pena. Caminhou alguns passos e, antes de sumir no horizonte, escutou um grito:
“ESPERE POR MIM!!!!!!!”
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
- O Alquimista (Paulo Coelho) -
Certo dia uma menina linda de quem gosto muito me pediu para ler uma estória para ela. Eu, meio sem saber uma estória especial, decidi pegar uma livro muito antigo da minha mini biblioteca, é este o segundo livro que tive, o primeiro emprestei a alguém que não me lembro e nunca foi devolvido. Este livro de qual falo, que decidi pegar e ler um trecho aleatoriamente, chama-se “O Alquimista” de Paulo Coelho. E eu, por acreditar que cada um deve seguir sua “lenda pessoal” e que o mundo possui uma “alma”, e que quando se deseja alguma coisa o “universo conspira ao seu favor”, decidi postar esse texto, pois acredito que nesse mundo o acaso às vezes não é por acaso, e as coincidências são muito mais que coisas que coincidem. Dedico aqui a todos esse texto que é parte da obra literária mais bela que já li.
“Eram livros estranhos. Falavam em mercúrio, sal, dragões e reis, mas ele não conseguia entender nada. Entretanto, havia uma ideia que parecia repetida em quase todos os livros: todas as coisas eram manifestações de uma coisa só.
Num dos livros ele descobriu que o texto mais importante da Alquimia tinha apenas poucas linhas, e havia sido escrito numa simples esmeralda.
- É a Taboa da Esmeralda – falou o Inglês, orgulhoso por ensinar alguma coisa ao rapaz.
- E então, para que tantos livros?
- Para entender estas linhas – responde o Inglês, sem estar muito convencido da própria resposta.
O livro que mais interessou ao rapaz contava a historia dos alquimistas famosos. Eram homens que tinham dedicado sua vida inteira a purificar metais nos laboratórios; acreditavam que se um metal fosse cozinhado durante muitos e muitos anos, terminaria se libertando de todas as suas propriedades individuais, e em seu lugar sobrava apenas a Alma do mundo. Esta Coisa Única permitia que os alquimistas entendessem qualquer coisa sobre a face da terra, porque ela era a linguagem pela qual as coisas se comunicavam. Eles chamavam esta descoberta de Grande Obra – que era composta de uma parte liquida e uma parte sólida.
- Não basta observar os homens e os sinais, para se descobrir esta linguagem? – perguntou o rapaz.
- Você tem mania de simplificar tudo – respondeu o Inglês irritado. – A Alquimia é um trabalho sério. Precisa que cada passo seja seguido exatamente como os mestres ensinaram.
O rapaz descobriu que a parte liquida a Grande Obra era chamada de Elixir da Longa Vida, e curava todas as doenças, além de evitar que o alquimista ficasse velho. E a parte solida era chamada de Pedra Filosofal.
- Não é fácil descobrir a Pedra Filosofal – disse o Inglês. – Os alquimistas ficavam muitos anos nos laboratórios, olhando aquele fogo que purificava os metais. Olhavam tanto o fogo, que aos poucos suas cabeças ema perdendo todas as vaidades o mundo. Então, um belo dia, descobriram que a purificação dos metais havia terminado por purificar a eles mesmos.
O rapaz se lembrou do Mercador de Cristais. Ele havia falado que tinha sido bom limpar seus vasos, para que ambos se libertassem também dos maus pensamentos. Estava cada vez mais convencido de que a Alquimia poderia ser aprendida na vida diária.
- Além disso – falou o Inglês – a Pedra Filosofal tem uma propriedade fascinante. Uma pequena lasca dela é capaz de transformar grandes quantidades de metal em ouro.
A partir destra frase, o rapaz ficou interessadíssimo em Alquimia. Pensava que, com um pouco de paciência, poderia transformar tudo em ouro. Leu a vida de várias pessoas que tinham conseguido: Helvetius, Elias, Fulcanelli, Geber. Eram historias fascinantes: todos estavam vivendo até o fim sua Lenda Pessoal. Viajavam, encontravam sábios, faziam milagres na frente dos incrédulos, possuíam a Pedra Filosofal e o Elixir da Longa Vida.
Mas quando queria aprender a maneira de conseguir a Grande Obra, ficava completamente perdido. Eram apenas desenhos, instruções em código, texto obscuros.
- Por que eles falam tão difícil? – perguntou certa noite ao Inglês. Notou também que o Inglês andava meio aborrecido e sentindo falta de seus livros.
- Para que só os que têm responsabilidade de entender que entendam – disse ele. – Imagine se todo mundo saísse transformando chumbo em ouro. Daqui a pouco o ouro não ia valer nada.
“Só os persistentes, só aqueles que pesquisam muito, é que conseguem a Grande Obra. Por isso estou no meio deste deserto. Para encontrar um verdadeiro Alquimista, que me ajude a decifrar os códigos”.
- Quando foram escritos estes livros? – perguntou o rapaz.
- Há muitos séculos atrás.
- Naquela época não havia imprensa – insistiu o rapaz. Não havia jeito de todo mundo tomar conhecimento da Alquimia. Por que esta linguagem tão estranha, cheia de desenhos?
O Inglês não respondeu nada. Disse que há vários dias estava prestando atenção à caravana, e que não conseguia descobrir nada de novo. A única coisa que tinha notado era que os comentários sobre a guerra aumentavam cada vez mais.
Um belo dia o rapaz entregou de volta os livros ao Inglês.
- Então, aprendeu muita coisa? – perguntou o outro, cheio de expectativa. Estava precisando de alguém com quem pudesse conversar para esquecer o medo da guerra.
- Aprendi que o mundo tem uma Alma, e quem entender esta Alma, entenderá a linguagem das coisas. Aprendi que muitos alquimistas viveram sua Lenda Pessoal e terminaram descobrindo a Alma do mundo, a Pedra Filosofal, o Elixir.
“Mas, sobretudo, aprendi que estas coisas são tão simples que podem ser escritas numa esmeralda”.
O Inglês ficou decepcionado. Os anos de estudo, os símbolos mágicos, as palavras difíceis, os aparelhos de laboratório, nada disso havia impressionado o rapaz. “Ele deve ter uma alma primitiva demais para compreender isto”, pensou.
Pegou seus livros e guardou nos sacos que pendiam do camelo.
- Volte para sua caravana – disse. – Ela tampouco me ensinou qualquer coisa.
O rapaz voltou a contemplar o silêncio do deserto e a areia levantada pelos animais. “Cada um tem sua maneira de aprender”, repetia consigo mesmo. “A maneira dele não é a minha, e minha maneira não é a dele. Mas ambos estamos em busca de nossa Lenda Pessoal, e eu o respeito por isso”.”
(O Alquimista – Paulo Coelho)
Dedicado a você menininha....
“Eram livros estranhos. Falavam em mercúrio, sal, dragões e reis, mas ele não conseguia entender nada. Entretanto, havia uma ideia que parecia repetida em quase todos os livros: todas as coisas eram manifestações de uma coisa só.
Num dos livros ele descobriu que o texto mais importante da Alquimia tinha apenas poucas linhas, e havia sido escrito numa simples esmeralda.
- É a Taboa da Esmeralda – falou o Inglês, orgulhoso por ensinar alguma coisa ao rapaz.
- E então, para que tantos livros?
- Para entender estas linhas – responde o Inglês, sem estar muito convencido da própria resposta.
O livro que mais interessou ao rapaz contava a historia dos alquimistas famosos. Eram homens que tinham dedicado sua vida inteira a purificar metais nos laboratórios; acreditavam que se um metal fosse cozinhado durante muitos e muitos anos, terminaria se libertando de todas as suas propriedades individuais, e em seu lugar sobrava apenas a Alma do mundo. Esta Coisa Única permitia que os alquimistas entendessem qualquer coisa sobre a face da terra, porque ela era a linguagem pela qual as coisas se comunicavam. Eles chamavam esta descoberta de Grande Obra – que era composta de uma parte liquida e uma parte sólida.
- Não basta observar os homens e os sinais, para se descobrir esta linguagem? – perguntou o rapaz.
- Você tem mania de simplificar tudo – respondeu o Inglês irritado. – A Alquimia é um trabalho sério. Precisa que cada passo seja seguido exatamente como os mestres ensinaram.
O rapaz descobriu que a parte liquida a Grande Obra era chamada de Elixir da Longa Vida, e curava todas as doenças, além de evitar que o alquimista ficasse velho. E a parte solida era chamada de Pedra Filosofal.
- Não é fácil descobrir a Pedra Filosofal – disse o Inglês. – Os alquimistas ficavam muitos anos nos laboratórios, olhando aquele fogo que purificava os metais. Olhavam tanto o fogo, que aos poucos suas cabeças ema perdendo todas as vaidades o mundo. Então, um belo dia, descobriram que a purificação dos metais havia terminado por purificar a eles mesmos.
O rapaz se lembrou do Mercador de Cristais. Ele havia falado que tinha sido bom limpar seus vasos, para que ambos se libertassem também dos maus pensamentos. Estava cada vez mais convencido de que a Alquimia poderia ser aprendida na vida diária.
- Além disso – falou o Inglês – a Pedra Filosofal tem uma propriedade fascinante. Uma pequena lasca dela é capaz de transformar grandes quantidades de metal em ouro.
A partir destra frase, o rapaz ficou interessadíssimo em Alquimia. Pensava que, com um pouco de paciência, poderia transformar tudo em ouro. Leu a vida de várias pessoas que tinham conseguido: Helvetius, Elias, Fulcanelli, Geber. Eram historias fascinantes: todos estavam vivendo até o fim sua Lenda Pessoal. Viajavam, encontravam sábios, faziam milagres na frente dos incrédulos, possuíam a Pedra Filosofal e o Elixir da Longa Vida.
Mas quando queria aprender a maneira de conseguir a Grande Obra, ficava completamente perdido. Eram apenas desenhos, instruções em código, texto obscuros.
- Por que eles falam tão difícil? – perguntou certa noite ao Inglês. Notou também que o Inglês andava meio aborrecido e sentindo falta de seus livros.
- Para que só os que têm responsabilidade de entender que entendam – disse ele. – Imagine se todo mundo saísse transformando chumbo em ouro. Daqui a pouco o ouro não ia valer nada.
“Só os persistentes, só aqueles que pesquisam muito, é que conseguem a Grande Obra. Por isso estou no meio deste deserto. Para encontrar um verdadeiro Alquimista, que me ajude a decifrar os códigos”.
- Quando foram escritos estes livros? – perguntou o rapaz.
- Há muitos séculos atrás.
- Naquela época não havia imprensa – insistiu o rapaz. Não havia jeito de todo mundo tomar conhecimento da Alquimia. Por que esta linguagem tão estranha, cheia de desenhos?
O Inglês não respondeu nada. Disse que há vários dias estava prestando atenção à caravana, e que não conseguia descobrir nada de novo. A única coisa que tinha notado era que os comentários sobre a guerra aumentavam cada vez mais.
Um belo dia o rapaz entregou de volta os livros ao Inglês.
- Então, aprendeu muita coisa? – perguntou o outro, cheio de expectativa. Estava precisando de alguém com quem pudesse conversar para esquecer o medo da guerra.
- Aprendi que o mundo tem uma Alma, e quem entender esta Alma, entenderá a linguagem das coisas. Aprendi que muitos alquimistas viveram sua Lenda Pessoal e terminaram descobrindo a Alma do mundo, a Pedra Filosofal, o Elixir.
“Mas, sobretudo, aprendi que estas coisas são tão simples que podem ser escritas numa esmeralda”.
O Inglês ficou decepcionado. Os anos de estudo, os símbolos mágicos, as palavras difíceis, os aparelhos de laboratório, nada disso havia impressionado o rapaz. “Ele deve ter uma alma primitiva demais para compreender isto”, pensou.
Pegou seus livros e guardou nos sacos que pendiam do camelo.
- Volte para sua caravana – disse. – Ela tampouco me ensinou qualquer coisa.
O rapaz voltou a contemplar o silêncio do deserto e a areia levantada pelos animais. “Cada um tem sua maneira de aprender”, repetia consigo mesmo. “A maneira dele não é a minha, e minha maneira não é a dele. Mas ambos estamos em busca de nossa Lenda Pessoal, e eu o respeito por isso”.”
(O Alquimista – Paulo Coelho)
Dedicado a você menininha....
terça-feira, 2 de novembro de 2010
- O lago, alma de lágrimas (continuação da estória) -
Jolie caminhou sobre as águas do lago, ergueu delicadamente seus olhos para o céu estrelado e fitou a lua. Nunca havia visto a lua daquela forma e tamanho, surpreendeu-se com tamanha energia emanada pelo astro. Fechou os olhos por um instante, seus lábios pronunciaram algumas palavras que até mesmo ela desconhecia saber. As águas giravam sob ela formando um redemoinho que ascendia a um abismo de águas. Sentia, a cada gota que tocava sua pele, que não se tratava de água, mas sim de lágrima ancestrais derramadas desde o princípio da vida, desde o princípio de GAIA.
Ahhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!!!! Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!!!!!!
Uhmmmmmmmmm Uhmmmmmmmmmm
Tudo girava, o universo girava, o lago não mais era lago, o lago era alma de lágrima, alma de terra, alma de tudo e de nada. O lago é galáxia, estrelas e turbilhões de constelações, furacões de gritos e gemidos, vendaval de fogo e soluços. Mulher chorando, mulher triste, abandonada por todos que amou....
“você se foi e continua no mesmo lugar.... faz – me buracos, arranca – me os dentes, bebe o meu sangue, risca de cinza meus olhos. Não posso mais ver estrelas.... nem o sol e o calor de seu abraço... meu amante....... filho, por que me arranca os dedos? Por que queima meus cabelos? Por que envenena meu sangue? Não sabe que ao beber meu sangue envenena-se a si mesmo?”
“Cortina de sangue já veio, vento de morte sempre venta e traz bons ventos. TERRA, VENTO E AR, todos arrastados à decadência da morte, mas o FOGO nunca decai, nunca apodrece e nem sucumbe diante de suas mãos imundas. O FOGO há de vir julgar e separar. Purifica ó FOGO aqueles que caminham sempre contigo desde o princípio de todos as coisas”
A mulher ergueu o rosto e devorou Jolie com um olhar avassalador, devorou toda a sua coragem e força, e todo o universo voltou a ser simplesmente lago. Jolie abriu os olhos, percebeu-se sobre as águas, mas o medo a perturbava de tal forma que não mais conseguira concentrar-se, caindo nas profundezas do lago.
Caía e seu corpo afundava, afundava nas lágrimas derramadas pela lua refletida em sua própria dor, refletida em seu próprio sangue. É a morte que vem, pela água, pela lágrima, pelo sangue, Jolie percebera que afundara na tristeza de GAIA e lá seus pulmões se encharcariam nas lágrimas da alma do mundo e não mais poderia expirar um sopro de vida sequer.
Ele vem, movendo – se rápido pela floresta, corre o cavaleiro negro sem sua armadura negra, caçador de caçadores, corre, salta e mergulha no lago. Com um de seus braços apanha Jolie e a leva à superfície. Paula Weltem corre para ajudar no socorro e Jolie aos poucos livra-se do pânico e recupera a consciência. Ergue seus olhos e percebe que havia sido salva pelo Cavaleiro Negro, mas estranha, pois nunca antes o vira sem sua armadura, percebe que seu corpo é repleto de símbolos tatuados. Aqueles símbolos lhe pareciam familiares, mas os que cobriam os braços dele lhe chamaram a atenção, eram dragões tatuados que prolongavam a cabeça em direção às mãos.
Sabia saber o significado daquilo, mas não se lembrava. Por um instante sentiu-se segura e adormeceu. Assim Paula Weltem e o cavaleiro negro a levaram de volta ao seu quarto.
para saber o que ocorreu antes: http://acancaodeumaalma.blogspot.com/2010/05/o-olhar-da-deusa.html
sábado, 30 de outubro de 2010
- O alvorecer de um novo Davi -
Davi há muito tempo tornara-se homem, porém, olhando sua estatura, as pessoas, vitoriosas e derrotadas, segundo dogmas sacerdotais do deus Markt, o chamavam de “menino”. “Venha cá menino” ou “muito obrigado garoto”. Assim escutava diariamente ao cumprir suas tarefas provedoras de sustento.
Ao ouvir essas palavras pensava consigo: “tamanho nunca teve a ver com aparência”, mesmo indignado permanecia e tolerava, pois era impossível provar ao mundo inteiro, ou pelo menos a todas as pessoas da cidade, da grandeza que sabia possuir.
Diziam eles: “lá vai Davi, sempre quicando de um lado para o outro, indo para onde o empurram”. “Sempre aprendiz, nunca guerreiro como nós”, diziam homens de braços e barrigas grandes que se consideravam alguma coisa nessa vida.
Mas Davi tinha um sonho, queria um dia se tornar um guerreiro, porém não como os barbuchudos e barrigudos que conhecera, mas sim como um que viu há muito tempo e que jamais, em suas andanças pela terra, viu alguém semelhante. Este diferenciava de todos e era único em sua singularidade, pois tinha a capacidade de voar com asas de metal.
O tempo nunca decorre, sempre se afirma, céu escuro e firme. Das nuvens obscuras surge uma fera imensa, grandiosa, que devora e destrói a tudo que se ergue. Todos os guerreiros e também os demais puseram – se a lutar, mas era ineficaz.
O tempo nunca decorre, sempre se afirma.” Afirmo – me agora”, pensou Davi, sentou sobre uma criatura alada, voou, sem deus, sem garantia. Seu coração era seu deus, lançou-se velozmente até tornar-se um raio na imensidão do céu. Todas as pessoas o viram e não acreditaram, a claridade do raio que se tornara feriu todas as vista possíveis e, num instante, transpassou a criatura a muito temida.
Ninguém nunca mais o viu e essa história durante muito tempo foi recontada, reinterpretada, re – dita. Continuada e vivida de inúmeras maneiras diferentes. Que assim seja....
.....”HERÓI”
domingo, 24 de outubro de 2010
- Tábua dos bem – aventurados V: Do caminho sem propósitos -
Aprender a voar com asas de metal.
Compreender a vida como instante de raio.
Estar repleto de si mesmo.
Escutar a própria alma entoar uma canção.
É tudo o mesmo exacerbado e expandido, comprimido e intensificado.
Caminho do guerreiro errante, amante das desgraças, admirador de cicatrizes, carrega no peito um coração de retalhos.
Um raio cai sobre seu corpo, aperta-o por entre as mãos e golpeia o ar fazendo surgir inúmeros pontos de origem de futuro.
O corpo pensa e fala simultaneamente, “incessantemente”...
Por traz de toda essa correria há um sonho de vida...
Que se realiza...
Em
Algum
Lu
Gar......
- Inquietude -
Meu semblante sereno abriga um espírito que se debate.
Gotas d’água caem e retiram a lama.
Cada impacto uma deformação.
Em cada deformação uma reconstrução e uma tentativa de reafirmação.
Meu espírito quer corporificar-se, abalar e sacudir o mundo.
Há milênios castigado grita o espírito, sofredor, rangedor de dentes.
Confinado na serenidade do corpo segura um relâmpago e golpeia internamente, cria rachaduras, buracos. O corpo racha, rechaça, mas é resistente. Calmaria e conformidade, animal que apanha nas costas, superfície corporal endurecida.
O espírito golpeia, quer sair e ganhar o corpo, rebelar-se, voar.
O Turbilhão do espírito devora e rasga, eleva, abala o mundo.
Nervoso, mordo e arranco sangue dos meus lábios, observo meu olhar, alguém vai morrer, sinto que posso morrer, o frio passa e sinto calafrio. Gato pulando o muro, caindo e correndo escuridão adentro... Vendaval!!!! AHHH!!!!!
Me joguei da montanha e não voei!!!!!!!!
Me joguei no mar e não mergulhei!!!!!
Rodopio e crio luz, viro estrela de ponta de pé no chão.
Inquietude!!!!
Inquietude incessante!!!!
Inquietude, sinto choque por dentro do corpo arranhando.
Minha mente assim é cortada, meu espírito assim chora, meu corpo assim sofre.
Medos não manifestados...
Vidas não vividas que amargam.
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
- Não Permanência -
Eu parti com os pés sangrando e o coração em retalhos assim como aquele que me lembrou de quem eu sou.
Eu parti aos tropeços, caindo às vezes e ferindo minhas mãos, mas delas a vida nunca me escapou.
A mulher eterna na rosa que exibia o coração escondia algo em seu olhar. Olhei fundo em seus olhos, havia um buraco, tão negro, tão obscuro, tão profundo e sem fundo que tragava para dentro de si todo o brilho existente no olhar.
Olhava ela atentamente seu coração, tão puro, tão perfeito e bonito. Por um momento perdeu-se em seus pensamentos, seus olhos pararam de piscar por um momento e, quando retornaram a piscar, trouxeram consigo gotas de lágrimas.
Punhal cravado no coração abrindo um rastro de sangue que escorre, logo logo tornar-se-á uma cicatriz de comprimento semelhante a uma estrada. A flor lentamente desaparecerá e pés e pernas surgirão. Coração bate, sangra, bombeia vida para o resto do corpo.
- "Aidós" -
Uma borboleta veio e sussurrou palavras em meus ouvidos, disparei em velocidade e me lancei contra um muro. Agora há passagem, mas meu coração foi fragmentado. Talvez, se tivesse feito de forma distinta da que a borboleta soprou em meus ouvidos, não teria fragmentado meu coração. Mas não importa, tenha caminho por entre o muro, vou juntar todas as partes do que ficou fragmentado e costurar.
Uma luz veio e feriu-me os olhos, praguejei contra ela, mas para saber se realmente a intenção da luz era ferir meus olhos, devo atirar meus pensamentos para o mais distante que se possa pensar e alcançar a origem de tal luz. A origem nasce fraca e pura, mas os acontecimentos a moldam e em sua trajetória adquire agregados que lhe distorcem e embrutecem.
Uma canção de flauta veio e tomou meus ouvidos, segui com passos de pés ensanguentados caminho do muro adentro. Pés sangrando, corpo em pedaços e coração costurado. De cada gota de sangue que escorre pelo meu corpo brota um conhecimento.
Sigo a canção de flauta e vejo uma mulher em uma flor ou flor em mulher, enxergo com dificuldades, mas ambas as criaturas são uma e a mesma criatura e dela provém tal canção de flauta. Canção de sereias atraindo pescadores para a morte, enfeitiçados seguem o balanço do mar, enfeitiçados seguem o canto do olhar. Criatura mista e garrada. Exibe a todos seu coração intacto, sem rachaduras, repleto de vitalidade e beleza assim como sua face, assim como teu corpo. Assim, observando, permanecem muitos homens. Assim, observando, permanecem muitas mulheres. Tal criatura, repleta do belo mas carente de movimento, sua beleza infinita marca um ponto, mantém-se na rosa, teme sair e não mais ter beleza, por isso aprisiona a todos com sua canção de flauta, por isso seu coração é sem rachaduras, cheio de vitalidade, belo.
Mas o meu, repleto de retalhos, que perdeu muitos pedaços e os tem espalhados nos inúmeros lugares que passei, é feio, tem caminhos traçados por linhas de costura. O máximo que posso fazer é suplicar por um pouco da contemplação do belo assim como esses homens, assim como essas mulheres.
Caminhava eu com meu coração em retalhos, segurei com a mão, olhei para ele e decidi jogá-lo fora. Vou ficar ali, com aquelas pessoas, talvez em meu peito nasça um novo coração e assim poderei zelar por ele para que nunca se arranhe ou se quebre.
Coração, o chão será sua morada e não mais meu peito.
“O que você é?” Gritou uma voz. Olhei de semblante baixo e vi um homem com uma cabeça de leão.
“Sou um guerreiro errante, eternamente pecador.” Respondi.
Olhou em meus olhos com seu olhar selvagem de fera com coração forte.
“Antes de fazer isso lembre-se de algumas coisas: quem você é; para onde decidiu dirigir seus passos; e pelo quê você luta. Você optou ser um guerreiro, mas, agora é com você.”
Peguei meu coração e o pus novamente em meu peito, bateu forte, bateu alegremente. “Aidós” gritou o homem com cabeça de leão, “sempre quando sentir que fraqueja, lembre-se dessa palavra”. Partiu então o homem com cabeça e coração de leão. Partiu também o guerreiro com semblante de homem e coração costurado. Permaneceu, com seus corações e belezas intactos a rosa-mulher e todos aqueles que temiam se fragmentar e assim ter que sempre se reconstruir.
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
- Sacrifice -
Pego uma arma e disparo contra minha alma, é no suicídio que encontro comigo mesmo.
Salto por cima dos dias em que me ausento de minha presença, espero sobreviver à vinda do grande tornado.
Estou de pé, ainda, mas minhas asas de metal se tornaram pesadas demais e isso tem feito rachaduras em minhas pernas.
Sacrifico – me ao eu que ei de vir sem mortalizar o que estou sendo.
Salto por cima dos dias em que me ausento de minha presença, espero sobreviver à vinda do grande tornado.
Estou de pé, ainda, mas minhas asas de metal se tornaram pesadas demais e isso tem feito rachaduras em minhas pernas.
Sacrifico – me ao eu que ei de vir sem mortalizar o que estou sendo.
- Retirando a carcaça. -
Passei
Passei rápido demais,
As pessoas dessa cidade reteram em suas retinas apenas minha sombra.
Minha sombra. Minha sobra. Ofusca-lhes a visão.
Não veem a mim em meio a essa cor cinza.
Passei e por um momento parei,
Enfiei minhas unhas por dentro de minha pele e arranquei minha carcaça escamosa, tão dura, tão seca, tão imóvel.
Retirei minha carcaça, minha carapaça, troquei de pele e larguei a antiga no meio do caminho.
As pessoas da cidade, com os olhos ofuscados pela sombra que deixei, observam minha carcaça e se perguntam: “Quem é tal homem caído no chão? Sempre imóvel, sempre rastejando no mesmo lugar. Quem será?”
Observam e definem, dizem ali ser homem e o guardam para a eternidade. Eu há muito passei e larguei no meio do caminho o que já não sou mais. Mas o que sabem sobre o que sou é apenas sombra e carcaça.
Passei rápido demais,
As pessoas dessa cidade reteram em suas retinas apenas minha sombra.
Minha sombra. Minha sobra. Ofusca-lhes a visão.
Não veem a mim em meio a essa cor cinza.
Passei e por um momento parei,
Enfiei minhas unhas por dentro de minha pele e arranquei minha carcaça escamosa, tão dura, tão seca, tão imóvel.
Retirei minha carcaça, minha carapaça, troquei de pele e larguei a antiga no meio do caminho.
As pessoas da cidade, com os olhos ofuscados pela sombra que deixei, observam minha carcaça e se perguntam: “Quem é tal homem caído no chão? Sempre imóvel, sempre rastejando no mesmo lugar. Quem será?”
Observam e definem, dizem ali ser homem e o guardam para a eternidade. Eu há muito passei e larguei no meio do caminho o que já não sou mais. Mas o que sabem sobre o que sou é apenas sombra e carcaça.
domingo, 10 de outubro de 2010
- O que constitui o guerreiro: O encontro com o Filósofo. -
Ando em meio à tempestades, não mais escondo-me em minhas sombras. Ali, por entre aquelas montanhas, há uma pequena cidade. Talvez encontre abrigo, talvez encontre a repulsa, talvez encontre o inesperado, pois a magia dos momentos se encontra nas pequenas surpresas. Mas magia não somente é brilho, as proporções de seus efeitos são inimagináveis, podendo atrair desgraças e precipícios. Porém não mais me amedronto, aprendi que todos os acontecimentos que emergem no caminho do homem são constitutivos do guerreiro.
Embora pudesse avistar tal cidade, ou melhor, tal vilarejo, pois havia poucas moradias e estas, erguiam - se com todas as fibras possíveis de se reunir. Percebi isso, pois resistiam a essa tempestade, terrível, assustadora. Chegando, ao centro, havia uma pequena praça, as pessoas se escondiam em suas casas, fechavam as portas e janelas, temiam tempestades, eu porém, sou amante de tempestades, é impossível para mim conceber meus caminhos isentos de tal acontecimento.
Observei com vista cansada, mas não abalável, meus olhos nada cansam de ver, e quanto mais veem mais visão desejam. Vi então dois homens em meio a essa praça, usavam roupas escuras, uns trajes nunca vistos antes por aqui. Usavam faixas em suas testas portando palavras que, pelo fato de estarem expostas em suas testas, deviam significar muito para eles. Na cabeça de um estava escrito: “Mestre”; no outro: “Doutor”.
Conversavam em voz alta em meio à praça. Falavam como se suas vozes fossem dotadas de poder, pois suas palavras eram afiadas como facas. Pude ouvir então eles comentarem que logo mais acima havia uma cabana. Dizia, segundo o que escutei, que ali era a morada de um filósofo.
“Mestre” e “Doutor” puseram – se a caminho. Eu, mesmo não temendo tempestades, mas atendendo às necessidades do corpo, pus-me a segui-los. Talvez esse homem que chamam de “filósofo” possa me acolher pelo menos durante essa noite.
Os homens bateram à porta e entraram. Aproximei quase junto a eles e pude vê-los entrando e também o interior da casa. Lá dentro havia um homem aparentando idade, pois sua barba já branca ultrapassava o pescoço. Aquecia-se diante de uma fogueira, contemplava as chamas do fogo como alguém que estivesse diante de algo muito sagrado.
“Entrem, pois aqui também estão presentes os deuses”, disse o velho filósofo. Os dois homens pareceram ter se decepcionado e disseram: “perdemos nossa viagem, viemos de uma época tão longínqua em busca de um grande pensador e aqui encontramos apenas um velho falando de deuses, mal sabe ele que todos os deuses já foram expulsos do Olimpo e que lá agora reinam os homens”. Viraram as costas e saíram.
“E pensar que esses são os nossos herdeiros” disse o velho, “nada compreendem”.
Nesse momento entrei silenciosamente e lhe pedi abrigo, o velho então permitiu que eu entrasse. Ele, após minha entrada, permaneceu em silêncio observando o fogo. Esse silêncio me incomodava, resolvi então puxar conversa com ele. Se o chamam de “filosofo” é porque deve ser muito sábio, ou, talvez, louco? Fala que há deuses aqui, eu não vejo nenhum, sei lá, perguntar, dependendo a forma com que se pergunta, não ofende.
“Você disse àqueles homens que aqui também se fazem presentes os deuses. Como? Eu não os vejo!”
Ele levantou-se e se dirigiu a uma janela no fundo da sala, ficou observando por alguns minutos, parecia paralisado. Com sua mão direita abriu a janela, um vento terrivelmente frio e carregado de gotas d’água invadiu a sala, ele me pediu para olhar para fora e me perguntou: “O que você vê?”
Respondi que não havia nada mais que uma floresta em meio a uma tempestade.
“Não há floresta e nem tempestade, mas sim um rio que passa levando consigo as águas mortas e renovando esta correnteza com outras águas. Cada folha de cada árvore está em combate com cada fragmento de vendaval, com cada fragmento de gota d’água e nesse combate nasce o vencedor e o derrotado. Ou a folha cai, ou esta permanece firme em sua força, sendo soberana a cada fragmento de gota d’água e a cada fragmento de vendaval. Assim o todo é guerra, assim o todo é rio fluindo, água arrastando pedra, pedras se juntando umas sobre as outras tentando, inutilmente, fazer represa. No todo tudo está lançado no jogo das possibilidades. Imagine agora isso acontecendo em todos os lugares, do minúsculo ao mais expandido espaço, simultaneamente. A isso chamo Devir, porém, esta é apenas uma visão, a compreensão necessita de muito mais horizonte.”
Dita estas palavras, fechou a janela e sentou-se no chão, próximo a ele havia um saco, e de lá começou a retirar pedras.
“Que são essas pedras?” perguntei.
“São fragmentos de minha ‘pedra filosofal’”.
Em cada pedra havia palavras inscritas. Ele tirou uma e disse que era um presente, eu então aceitei, e nesse fragmento de “pedra filosofal” estava inscrito: “O raio governa todas as coisas. Sobrevindo o fogo, julgará e condenará todas as coisas.”
Segurei a pedra em minhas mãos e li esta frase. Ergui meus olhos e a cabana havia desaparecido, não havia mais “filósofo”, nem tempestade e nem janela, tudo agora era um imenso deserto, olhei pra o céu e vi um meteoro tracejando seu rastro de fogo, perto, muito perto, chocou-se então, não muito distante, com a terra, corri então para ver aonde havia caído. Chegando ao local, do lado da cratera, havia um imenso espelho, me aproximei. Algo semelhante e ao mesmo tempo diferente do meu reflexo aparecia.
Mas, há algo de errado, a imagem no espelho não corresponde a mim, mas sim a um homem, que também segura um pedaço de pedra na mão, porém tal homem possui negras e compridas “asas de metal”. A curiosidade nesse momento tomou em emoção meu coração, todos os movimentos eram repetidos pelo outro do espelho. Mas ele também possui um pedaço de pedra na mão, que diabos está escrito lá? Ou talvez a pedra esteja lisa?
Se os movimentos se repetem, se eu erguer a pedra assim também a imagem também o fará. Bom, assim espero. Ergui então minha pedra e, da mesma maneira, o outro também o fez, em sua pedra também havia uma frase, e...
“lá estava escrito....”
“lá estava escrito...”
“Repleto de si mesmo” (http://acancaodeumaalma.blogspot.com/2010/07/fragmento-de-meteoro.html )
“O raio governa todas as coisas”
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
- Do último momento -
Vivo nestes momentos precedentes ao fechar de olhos sempre me lamentando.
Rastejo, minha face cai sobre a mesa, minha alma não cabe nessa extensão de corpo.
Agora que me vejo e me contemplo, mesmo que morrendo, sei que devo me deitar, pois o amanhã necessita que eu esteja repleto de forças.
Remédios, para que? Tento retardar a natureza, mas meus cabelos um dia irão cair.
Renuncio – me, e agora tenho a mim mesmo, mas o tempo é curto.
Sou imenso demais para um tempo curto.
Lamento ó mim mesmo, por mim, por renunciar-me.
Escrevo estas palavras....
Querendo chorar....
Mas disso o sono me priva.....
Sei que amanhã é outro dia e isso me consola, mas, não quero ter tal sensação quando o último dos dias chegar.
sábado, 2 de outubro de 2010
- Quezacolt e a constituição do guerreiro: das possibilidades. -
Caminhava eu pisando sobre a terra, pois há muito deixara de seguir pelos caminhos alagados do mar obscuro. A cada passo realizado compreendia um pouco mais sobre a vida como “instante de raio”. Confesso que, após ter assumido meus medos e minha covardia, tenho me sentido mais forte, quase consigo olhar nos olhos das pessoas que julgava serem mais fortes que eu. Percebi que, para ser ouvido, não necessito exaltar e entoar gravemente meu tom de voz, mas, falar calmamente sabendo o que se fala e respeitando meu próprio ritmo de fala, dessa forma, a presença diante dos outros se configura.
O horizonte que vejo é unidimensional, configura – se numa linha reta, minha visão é limitada e ofuscada. Mas, estou aprendendo a me manter de pé sobre o solo, os caminhos de correntezas por mim já passaram há muito tempo. A vida é um “instante de raio”, compreendendo um pouco isso utilizo minhas pernas e meus braços, rasgo o horizonte que se abre diante de meus olhos, os sons de trovão vital lançaram-se no aberto do horizonte. Pude ver então dois eventos, dois fantásticos eventos, e eu era o protagonista de ambos.
Trata-se de acontecimentos distintos que não se tocam, mas a origem deles é a mesma, encontram-se somente na origem e prolongam-se infinitamente para diversas direções. Sou ambas e sou origem.
Daqui de onde estou, posso dar um passo para cima, ou então.... para baixo..... Mas, um passo à frente não mais volta a ser passo anterior, pois assim se configura a escolha. Fecho os olhos, tenho medo, tudo isso me assusta, a novidade sempre traz consigo o pavor do desconhecido. Atiro meu corpo e o deixo cair lentamente num dos eventos, não mais vejo de fora, mas sim coexisto nele agora. Existo e existo nesse evento, por um momento é bom, prazeroso, mas depois minhas mãos começaram a sangrar, meus pés também. Sinto medo! Se estivesse escolhido a outra possibilidade não estaria sangrando agora, mas sim desfrutando de prazeres eternos.
O momento ao qual fazia parte perdia sua luz. Fez-se noite. Noite no dia? Não faz diferença para quem não deseja a visão e a escolha. Olhei para o céu, procurava luz. Onde há luz? Onde há sol agora nesse momento? A serpente alada mais uma vez sobrevoou a nuvem negra de meus pensamentos, fez do céu escuro sua morada obscura. Desceu, abriu a boca e de lá saiam feixes de luz.
“Quando se inicia a compreensão da vida como instante de raio cada passo é o primeiro e decisivo. Em cada decisão se ganha e se perde, cada possibilidade assumida significa o assassinato de todas as outras que da origem partiram para rumos distintos. Viver tentando ver o evento que poderia ter sido e lamentar-se pela perda é apagar o fogo que o raio deixa quando toca a terra. O que morreu está morto e, daquilo pelo qual se decidiu, deve - se abarcar cada milímetro de acontecimento. Vivemos contabilizando o que perdemos pelas possibilidades mortas e esquecemos o que ganhamos com o que assumimos, e ganhar pode ser prazer e desprazer, mas tudo é constitutivo, por isso deve ser aproveitado, só assim a origem é re-feita, somente assim vislumbra-se outros eventos e se escolhe por eles. Somente dessa maneira, a vida torna-se um jogo onde sempre se ganha, pois até mesmo a derrota nos honra como vitoriosos. Somente assim se torna “repleto de si mesmo”.”
Quezacolt mais uma vez partiu deixando-me um saber.
“Glorifiquemos então nossas derrotas e nossas desgraças, pois tudo nos é constitutivo.”
- O Pescador e sua rede furada -
Peguei uma folha em branco, amacei e joguei no lixo
O dia se foi, nada nele escrevi
Arranquei essa página do livro da minha vida e a lancei fora.
Tento espremer o ultimo bagaço do dia que se foi para ver se cai uma gota de vida e assim matar minha cede.
O arco girou e nada laçou
A rede foi atirada sobre um cardume
Mas o pescador ficará com fome hoje, pois sua rede furada nada alcançou.
Cansaço, mormaço do mar, a jangada balançou e balançou,
O mar é o mesmo, o pescador permaneceu o mesmo.
Tristeza, e em sua rede, nenhum peixe para se consolar.
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
- Da arte de domar leões. -
A fera vem, sinto seu cheiro, escuto seus passos, sinto o deslocamento de ar que seu corpo causa. Olho no olho, morte no olhar, dentes afiados e compridos, dilaceradores de corpos.
A possibilidade de fera vem a cada amanhecer, ergue-se com o sol, ergue-se com o erguer de minhas pálpebras. A possibilidade de fera se efetua com o cair da tarde, com a finalização do sacrifício. A possibilidade de fera me é concretizada quando estou comigo mesmo.
Ela vem, sinto seu cheiro, escuto seus passos, sinto o deslocamento de ar que seu corpo causa. Vem, perseguindo a presa. Vem e me devora por dentro. Vem e fere minha alma. Meu corpo decai.
Eu... me afasto de mim....
A fera adormece parecendo estar morta, mas sempre permanece a possibilidade do retorno até que a fera esteja domada. Mas, mesmo domada pode romper as correntes, portanto, não nos preocupemos com a natureza e a natural.
Porém, há um tempo em que a morte vem e a fera morre. E o homem, pobre homem, acha que se tornou rei. Abro aqui para a arte, todo o tipo de pintura, todo o tipo de escultura, a arte sendo artista de si mesma. A isso chamo “assenhorar-se de si”, porém, não cometam o terrível erro de chamar tal grandiosidade de “ascetismo”.
sábado, 25 de setembro de 2010
- - Há “dez mil anos atrás” -
“Um dia, numa rua da cidade, eu vi um velhinho sentado na calçada
Com uma cuia de esmola e uma viola na mão
Havia muita gente ali parada para ouvir, eu então também parei. Ele agradeceu as moedas
E cantou uma música, que contava uma história
Que era mais ou menos assim...”
“Eu nasci há dez mil anos atras...”
Enquanto eu escutava aquela música, meus olhos correram por todos os rostos que se prestavam a contemplar tal arte. Todas as pessoas ouviam e gostavam. O velhinho realmente era talentoso. Mas, dois caras me chamaram a atenção, ambos usavam cafanhaque e óculos escuro. A música parecia falar diretamente à alma deles.
Terminada a música, esses caras subiram em uma moto, planejavam sair pelo mundo e fundar algo que chamaram de “sociedade alternativa”. Mas nada disso me importa, o que importava era o velho, falou de tantas coisas apaixonadamente, como alguém que sente saudade, que parecia realmente ter feito todas aquelas coisas e ter, realmente, dez mil anos de idade.
“Mas tudo isso é besteira....” Pensei em vóz alta.
“Viver não é besteira....” escutei uma vóz cair sobre meus ouvidos.
Virei os olhos para tras, o velho se aproximou, tocou em meu ombro e disse:
“A vida é um instante de raio na imensidão do céu e sua origem está nas grandes tempestades”
Dita estas palavras, desapareceu e continuou a caminhar pelas ruas da vida com sua cuia de esmolas e sua viola na mão, mudando o distino de todos os que escutam suas palavras atravéz de sua canção.
Anos mais tarde ouvi falar algo de uma “sociedade alternativa”, porém seus idealizadores não obtiveram muito sucesso com essa ideia....
Mas, com outras ideias, ganharam o mundo....
E suas palavras ganharam meus olhos e ouvidos.
(inspirado na música “eu nasci há dez mil anos atrás” de Raul Seixas e Paulo Coelho)
- Minha pintura -
Sinto que perdi o chão, não por caminhar nas nuvens, mas por cada passo parecer uma queda.
Sinto que perdi a direção, não por saber pra onde é o norte ou o sul, mas pelo próprio sol ter desaparecido do meu horizonte.
Dentro de minha casa, os móveis ficaram de pernas para o ar, não tem mais cama e nem cadeira para me sentar.
A janela para olhar a noite permaneceu, mas as estrelas sumiram do meu céu.
Vento frio, não tenho mais cobertor, nem calor, nem dia.
Horizonte aberto e opaco....
Toda a pintura que pintei guardei....
Aqui..... :. . : .: .: ...
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