sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

- O encontro com Zaratustra -


Após ter passado pelos sete encontros das quatro direções deparo-me com uma montanha, será que necessitarei subir ao mais alto ponto já contemplado por mim neste mundo para saber o mistério do guerreiro mítico? Aquele que deseja o saber dos mistérios deve arriscar a vida, pois quanto maior o conhecimento, maior o perigo, e um pensamento errado pode nos desviar de tal conhecimento.


Mas, por que escalar se possuo asas para ao topo poder voar? Afastei-me algumas centenas de centímetros, pus-me a correr com toda a minha força e saltei o quanto minhas pernas permitiram e com o bater de asas tentei voar, mas algo estranho aconteceu, elas voltaram a ficar pesadas, pois num momento havia mudado meu pensamento e um simples desvio de pensamento pode afugentar o mais sagrado dos conhecimentos.

Percebendo o início de minha queda atirei-me em direção da montanha e me agarrei a ela, mas ela estava cheia de cacos de vidro que penetraram em meu corpo, sentia minha pele ser rasgada e perfurada. Apesar de tudo me mantive firme, tenho que efetuar tal subida mesmo que me custe algo de muito valor: minha saúde física. Escalei com todo o meu empenho e os cacos de vidro que estavam na montanha foram ficando para traz. Senti-me então otimista, o pior havia passado? Não!!! O pior ainda estava por vir!!! O vir – a –ser da alta periculosidade. Surgiram então, mãos e línguas da montanha, as mãos agarravam-se aos meus braços e pernas e os puxavam para baixo, as línguas adoeciam minha mente com palavras profanas e blasfemadoras de vida, expeliam toda a imundície, todo o escárnio do linguajar humano.

(línguas) – A nossa saliva atiraremos no pó do seu corpo que putrefará, faremos assim lama, e lá porcos dançarão e profanarão aquilo que seu corpo será, agora inundado de saliva das línguas dessa montanha, plantas de espinhos cresceram no barro e se alimentarão de moscas e todo tipo de vermes.

Essas palavras e diversas outras causavam terror na minha alma que ansiava partir, mas precisava soltar – me das mãos que me prendiam, não tinha alternativa a não ser golpear a montanha, mas, talvez não aconteça nada, talvez eu morra, talvez haja um monstro e me devore. Mas devo tentar.

Golpeei então a montanha com o meu punho, meu braço foi tragado para dentro por completo e pude perceber um sangue escorrendo de dentro da montanha. Como será possível uma montanha sangrar? Devo ter ferido-lhe o coração, e as mãos num instante ficaram paralisadas e as línguas secaram e caíram. Pude então continuar minha subida.

Após ter superado todo o percurso, alcancei o topo da montanha, com muito sacrifício consegui por o meu corpo por completo e deita-lo lá, mas o sofrimento continuaria, pois ali havia um homem sentado que olhou para mim e falou.

(HD) – você é muito ousado, ter desafiado a minha montanha e ter subido até aqui para obter um conhecimento que talvez lhe fará sofrer mais ainda..... muita idiotice da sua parte..... o conhecimento é só para aqueles que estão dispostos a suportarem o sofrimento.

(AM) – Quem é você, homem falante de voz pesada?



(HD) – tenho muitos nomes, uns me chamam de “Nietzsche”, outros de “Zaratustra”, mas isso não importa. Está aqui por que quer encontrar alguém não é?

(AM) – Como sabe?

(Z) – Vejo muito mais longe que qualquer homem desse mundo, e se ergui essa montanha, foi por ter decido fundo na dor da humanidade da minha época para mostrar-lhes que era possível viver sem condenar a própria vida.

(AM) – Mas, como que você irá me ajudar, como que irei ter o conhecimento necessário para poder voar com perfeição e encontrar quem preciso encontrar.

(Z) – Para voar pelos outros é necessário voar por si, sem si mesmo, nada pode pelo outro. E, digamos, como eu lhe disse, sou o homem que mais longe vê, e eu, tendo essa capacidade, posso saber de coisas que você nem sonha em saber, ora, ergui uma montanha, a mais alta desse mundo. Portanto, digo, quem você procura não mais lhe aguarda, pois foi encontrada por outra pessoa.

Dito estas palavras Zaratustra olhou friamente nos olhos do Homem de Asas de Metal e viu que escorria lágrimas de um silêncio ensurdecedor. Zaratustra continuava a observar o homem que se mantinha com a cabeça baixa e demonstrava-se pensativo.

(Z) – O que foi? Perguntou Zaratustra. Vai desistir de aprender a aperfeiçoar seu vôo?

Mantive-me em silêncio, pensando nas palavras que ele me disse, pode ser que esteja errado, mas, é o homem que mais longe vê, é o homem que edificou a mais alta e mais terrível montanha, e sempre que considerava verdadeira a sua afirmação meu coração rasgava os músculos do meu peito e sangrava pelos olhos.

(Z) – Tem mais uma coisa, lembra aquela cidade que você deixou para ir em busca daquilo que você já sabe que está perdido? Foi totalmente destruída, sem você com suas asas criadoras de furacões e tempestades para protege – la, todos morreram, inclusive as crianças, mas as mulheres fora levadas como escravas.

(AM) – Não!!!! Você é um mentiroso!!!

(Z) – Como que a verdade pode não estar comigo se consigo ver coisas da sua vida que estão a milhas de distância escondidos em seus pensamentos.

Calei-me...... não sabia o que dizer, percorri todo esse caminho, escalei essa montanha.... para quê? Para nada? Para constatar que tudo foi em vão?

(Z) – Quer saber como posso ver tão longe quanto nenhum outro ente é capaz?

(AM) – Isso é impossível..... como você pode? Você sem dúvida não é um homem comum, não é simplesmente um sábio...... o que você é de fato???

(Z) – Eu sou o “Super – Homem”, pois tive coragem de mergulhar no mais profundo abismo da dor e compreende-la, e ao compreender a dor, em meio a minha solidão, vislumbrei um enigma, e pude dar a mais gozada gargalhada. Superei a mim mesmo, trepei em minha própria cabeça para poder ver mais longe e subir mais alto. Quer voar com perfeição? Supere a si mesmo. Mas acho que não tem coragem para tanto. Você quer voar para os outros, isso é impossível, voe para si mesmo, e assim torna-se-á grande o bastante para abarcar aos outros.

(AM) – Dor, enigma, visão, por que a dor? Por que o sofrimento? Por que as asas são tão pesadas? Como lançar-me no mais profundo abismo da dor?

(Z) – Para isso você precisa de algo que se possui em raridade: solidão!!!

(AM) – Mas, a muito tenho caminhado sozinho.

(Z) – Solidão não é ausentar-se das pessoas, mas sim, na sua hora mais silenciosa, encontrar – se consigo mesmo. Por isso odeio a compaixão, rouba o direito de viver na dor do outro e o retira a possibilidade de ter solidão, fazendo – o perder-se de si mesmo.

(AM) – Não compreendo suas palavras.

(Z) - Torne-se solitário e entenderá.

Zaratustra então tocou – me com seu dedo na testa e, com um toque, empurrou – me do alto da sua montanha e comecei a cair, quando pensei que ia me espatifar no duro solo, penetrei-me nele e comecei a cair em meio à escuridão do abismo.

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