segunda-feira, 18 de outubro de 2010

- "Aidós" -


Uma borboleta veio e sussurrou palavras em meus ouvidos, disparei em velocidade e me lancei contra um muro. Agora há passagem, mas meu coração foi fragmentado. Talvez, se tivesse feito de forma distinta da que a borboleta soprou em meus ouvidos, não teria fragmentado meu coração. Mas não importa, tenha caminho por entre o muro, vou juntar todas as partes do que ficou fragmentado e costurar.


Uma luz veio e feriu-me os olhos, praguejei contra ela, mas para saber se realmente a intenção da luz era ferir meus olhos, devo atirar meus pensamentos para o mais distante que se possa pensar e alcançar a origem de tal luz. A origem nasce fraca e pura, mas os acontecimentos a moldam e em sua trajetória adquire agregados que lhe distorcem e embrutecem.

Uma canção de flauta veio e tomou meus ouvidos, segui com passos de pés ensanguentados caminho do muro adentro. Pés sangrando, corpo em pedaços e coração costurado. De cada gota de sangue que escorre pelo meu corpo brota um conhecimento.




Sigo a canção de flauta e vejo uma mulher em uma flor ou flor em mulher, enxergo com dificuldades, mas ambas as criaturas são uma e a mesma criatura e dela provém tal canção de flauta. Canção de sereias atraindo pescadores para a morte, enfeitiçados seguem o balanço do mar, enfeitiçados seguem o canto do olhar. Criatura mista e garrada. Exibe a todos seu coração intacto, sem rachaduras, repleto de vitalidade e beleza assim como sua face, assim como teu corpo. Assim, observando, permanecem muitos homens. Assim, observando, permanecem muitas mulheres. Tal criatura, repleta do belo mas carente de movimento, sua beleza infinita marca um ponto, mantém-se na rosa, teme sair e não mais ter beleza, por isso aprisiona a todos com sua canção de flauta, por isso seu coração é sem rachaduras, cheio de vitalidade, belo.


Mas o meu, repleto de retalhos, que perdeu muitos pedaços e os tem espalhados nos inúmeros lugares que passei, é feio, tem caminhos traçados por linhas de costura. O máximo que posso fazer é suplicar por um pouco da contemplação do belo assim como esses homens, assim como essas mulheres.

Caminhava eu com meu coração em retalhos, segurei com a mão, olhei para ele e decidi jogá-lo fora. Vou ficar ali, com aquelas pessoas, talvez em meu peito nasça um novo coração e assim poderei zelar por ele para que nunca se arranhe ou se quebre.

Coração, o chão será sua morada e não mais meu peito.

“O que você é?” Gritou uma voz. Olhei de semblante baixo e vi um homem com uma cabeça de leão.

“Sou um guerreiro errante, eternamente pecador.” Respondi.

Olhou em meus olhos com seu olhar selvagem de fera com coração forte.

“Antes de fazer isso lembre-se de algumas coisas: quem você é; para onde decidiu dirigir seus passos; e pelo quê você luta. Você optou ser um guerreiro, mas, agora é com você.”

Peguei meu coração e o pus novamente em meu peito, bateu forte, bateu alegremente. “Aidós” gritou o homem com cabeça de leão, “sempre quando sentir que fraqueja, lembre-se dessa palavra”. Partiu então o homem com cabeça e coração de leão. Partiu também o guerreiro com semblante de homem e coração costurado. Permaneceu, com seus corações e belezas intactos a rosa-mulher e todos aqueles que temiam se fragmentar e assim ter que sempre se reconstruir.

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